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segunda-feira, 12 de agosto de 2019

DOR E GLÓRIA


DOR E GLÓRIA
DIREÇÃO: Pedro Almodóvar
ELENCO: Antonio Banderas e Penelope Cruz


O cineasta Salvador Mallo está a viver um grande declínio em sua carreira, e num momento de reflexão da vida passa a relembrar tudo, inclusive a sua infância na cidade de Valência. Assim, amores, desejos e muita arte são o carro-chefe da trajetória de um ser, que tem no cinema o seu mais regozijante local de reclusão.


O saudoso Rubens Ewald Filho sempre defendeu o espanhol Pedro Almodóvar como o melhor cineasta do mundo. Tal opinião eu concordo em gênero, número e grau, mas, ao mesmo tempo, reconheço a falta de uma certa regularidade presente em sua carreira, há um pouco menos de 15 anos. Notem o seguinte: de 1997 a 2006, ele fez 5 filmes, sendo que todos são obras-primas, e faturou o Oscar por 2. São eles: Carne Trêmula, Tudo Sobre Minha Mãe (que eu considero ser o melhor filme da história da Espanha), Fale com Ela, Má Educação e Volver. Mas depois disso, só para servir de exemplo, podem ser citados o ruim Abraços Partidos e os de qualidade duvidosa A Pele que Habito, Julieta e Os Amantes Passageiros. O que estava acontecendo com o meu ídolo? A verdade é que Almodóvar é do tipo de profissional que o fã não deixa de confiar, e eis que uma nova era em sua carreira começa: Dor e Glória é mais uma excelente obra de sua filmografia.

O que seria aquela submersão? O que seria aquela cicatriz? No olhar e no emaranhado de coisas, logo fica a certeza de que o protagonista sabia que não se deve viver a vida do jeito que a gente quer, e sim do jeito que ela é, mas isso, por mais que seja a realidade, não é nada legal, pois em seu caso, o ócio vivido lhe tirava todos os motivos para simplesmente sorrir. Logo, Dor e Glória não se contenta e dá logo um tapa na cara de quem o assiste, pois é inevitável pensarmos que alguém, direta ou indiretamente falando, esteja imune a isso. Escrito pelo próprio diretor, o longa instiga o choque, e numa concepção de um personagem que seria um escândalo no Brasil, há um investimento em uma criança com atitudes, que, em um mundo extremamente machista, despertaria no mínimo uma reação lamentável por parte de seus entes mais próximos. Só que antes de uma conclusão para o ato, Almodóvar corta para um Salvador cinquentão, capaz de consumir drogas minutos após um mal súbito, tornando um adulto tão fascinante e despertador de nossa curiosidade quanto uma criança sonhadora.

O também espanhol Pablo Picasso já dizia: "A arte lava da alma a poeira da vida cotidiana". Para Salvador, faltava acreditar em quê? Seria em si próprio? Diante disso, desabafos são a arma do "tudo ou nada", ou seja, falar sempre o que pensa não é sinal de poder ou de falta de empatia, sendo que às vezes é um gesto de desespero. Num andar da carruagem que mostra um cineasta cada vez mais em situação preocupante, onde o espectador já espera o pior, Almodóvar corta para a sua infância, com enfoque à sua genitora, vivida pela vencedora do Oscar Penélope Cruz, que constrói em todos os sentidos, a imagem da guerreira, profundamente preocupada com a criação de seu filho, mas pouco se importando com as escolhas dele.

Na estrutura do roteiro de Dor e Glória, uma hora de duração é uma introdução suficiente para todos notarem o perigo na ideia de uma avó, mas mesmo que todos, inclusive Salvador, saibam que igualdade de condições é mito, a vida sempre será um remédio perigoso. Logo, uma saída é fugir do sentimentalismo, mas sem perder a emoção nas páginas que escrevemos e no ato de viver. Por isso, metaforicamente, o filme lembra que monólogos teatrais são mais reais do que possamos imaginar, atingindo seu autor, quem o interpreta e quem o assiste.

Mesmo sendo um filme que não nos parece estranho, o ponto positivo de Dor e Glória é que Pedro Almodóvar coloca seus toques mais especiais na trama, fazendo dela um lindo e positivo diferencial, seja no drama ou até mesmo em seu lado sacana, com direito a um Antonio Banderas que carrega o longa nas costas, com total maestria. Os bons desfechos tornaram as pessoas admiráveis, apesar dos pesares; e por onde formos, que possamos ir suavemente, pois o segredo da felicidade pode estar em qualquer lugar, até mesmo na Espanha, no México ou na Argentina, e assim, após a tempestade, é rápido que é desvendado o real motivo de um sorriso imediato.


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