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quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

HISTÓRIA DE UM CASAMENTO



HISTÓRIA DE UM CASAMENTO
DIREÇÃO: Noah Baumbach
ELENCO: Adam Driver, Scarlett Johansson, Laura Dern e Alan Alda


Nicole e Charlie formam um jovem e feliz casal, com um filho pequeno. Como ninguém está imune a situações desagradáveis, eles entram numa crise e decidem se divorciar. A princípio, a ideia era que a situação não envolvesse advogados, mas a não realização desse desejo leva todos a um cotidiano sofrido, por mais que se tente buscar meios para serem felizes.


Noah Baumbach é um cineasta nascido em Manhattan, adepto do subgênero alternativo chamado Mumblecore, que investe no que há de mais natural numa atuação, privilegiando o improviso num filme sem custos altos, onde o ser humano é o centro de tudo. Ele sempre investiu no simples, munido de uma leveza cômica, que, em 2006, lhe rendeu uma indicação ao Oscar de Melhor Roteiro por A Lula e a Baleia. Em História de um Casamento, ele chega a um emocionante ápice, virando-se mais para o lado dramático, genialmente nos levando aos prantos, mesmo em hipótese alguma parecendo ser apelativo.

Não é um trocadilho o filme ter o teatro como função prioritária do casal protagonista, muito menos a própria trama ter momentos em que mais parece uma arte cênica que ecoa o drama. Conceituado tal qual uma obra de Woody Allen (talvez por isso Scarlett Johansson esteja tão à vontade), o longa não inicia sem ser esclarecedor ao extremo, seja com os personagens ou com a própria história que está por vir, e nessa linha, o recado é bem dado: o amor é lindo, mas casamento é coisa séria. A atualidade é tão incoerente, que crises surgem de maneira natural, e o diálogo já não é mais tão importante.

Sem a mínima pretensão em parecer careta, Baumbach elucida que uma trajetória boa não é sinônimo de um final feliz, e as amarras da vida nem sempre nos deixa em paz com certas decisões. Logo, é até fundamental alguém deixar de ser submisso a um cônjuge, mas não adianta nada se a liberdade desse mal, migra para uma nova submissão, seja diante de seu ascendente ou de seu descendente. Em História de um Casamento, os diálogos lindamente mais parecem monólogos, e com closes certeiros, a situação está cada vez mais centrada no casal - isso faz com que o público deixe de ser uma testemunha e passe a ser um ouvinte ou até mesmo um conselheiro, pois a obra "joga muito bem isso para a torcida". Vale ressaltar que, diante do problema, o próprio espectador pode se identificar, e para nós brasileiros, vem logo o final de Lisbela e o Prisioneiro na mente e todas as reais metáforas cinematográficas que o filme propaga.

Diante de trapalhadas, loucuras familiares e até uma prisão de ventre, é fato que a sanidade não é perdida, mas reflexões são necessárias. Incertezas do processo, reações de outrem e o deixar a vida continuar fazem parte, mas isso não impede de fazer com que os nervos cheguem a um ponto em que temos vontade de matar quem estiver mais próximo de nós. O resumo disso é que Baumbach, que também assina o roteiro de História de um Casamento, consegue ser cômico até quando não quer.

Um cerne do filme é a concepção de um casal extremamente neutro, desprovidos de todos os atributos que formam um lindo ou um péssimo romance. Assim, todos que se dão ao direito de julgar, estão dotados da imparcialidade necessária para escancarar um parecer. No meio desse conluio, uma criança é usada corretamente, sem nenhum clichê e sem nenhuma intenção de copiar um Kramer vs Kramer da vida, para que a dimensão da situação fosse posta em pratos limpos. E na sala de audiência, a câmera focaliza individualmente o casal prestes a se divorciar e seus respectivos advogados - uma intenção certeira de Baumbach de enfatizar que são quatro realidades bem diferentes e a disputa pode caminhar para um resultado infeliz para ambos os lados.

No elenco, Adam Driver e Scarlett Johansson irônica e maravilhosamente tem uma química perfeita para marido e mulher em momentos de felicidade e de separação, com uma sutileza incrível a cada cena. História de um Casamento é um divisor de águas para os dois, pois apresenta-se como o filme perfeito para que finalmente Hollywood os leve a sério e reconhecer o grande talento de ambos - principalmente ela, que há tempos luta por isso e nem o fato de ser a atriz com o maior salário do mundo tem sido suficiente. Laura Dern, no papel de uma advogada de caráter duvidoso, deve levar todos os prêmios de Atriz Coadjuvante da temporada, inclusive o Oscar - fato que não me oponho, mas não posso deixar de dizer que vi, em sua atuação, muitos nuances da Renata, sua recente personagem na série Big Little Lies.

Um relógio na parede e o tempo e o drama vão seguindo. Uma trilha belamente melancólica ressuscita um Randy Newman, que há muito tempo não víamos fazendo belas composições para o cinema. Os julgamentos, mesmos divergentes, são sensatos. No tormento, como o próprio protagonista mostrou, a dica é a seguinte: entregue-se a música, pois, como diz o ditado, quem canta seus males espanta. Nós, tupiniquins, poderíamos lembrar de Cássia Eller dizendo: "Agora tanto faz. Estamos indo de volta pra casa". Uma lágrima minha caiu!

   

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