ENTRE FACAS E SEGREDOS

ENTRE FACAS E SEGREDOS

DIREÇÃO: Rian Johnson

ELENCO: Christopher Plummer, Don Johnson, Michael Shannon, Ana de Armas, Chris Evans, Daniel Craig, Jammie Lee Curtis e Toni Colette

Harlan Thrombey é um famoso escritor de contos policiais, que foi encontrado morto em casa, após a sua festa de aniversário de 85 anos. Com isso, o renomado detetive Benoit Blanc é contratado para as investigações, pois tudo leva a crer que houve um homicídio. O clima de tensão chega a um ápice, porque todos os seus familiares e funcionários são suspeitos do crime. 

O gênero de terror, apesar de, no geral, entregar obras com qualidades infinitamente inferiores as de outros gêneros, jamais irá perder uma gigantesca qualidade, que inclusive é bastante saudável. Quando sou indagado sobre qual é o meu tipo de filme preferido na linha do horror, sempre respondo que é o do assassino a ser descoberto no final. O cineasta Rian Johnson, pouco familiarizado com a área, assume o desafio de adentrar a temática, porém tomando uma decisão: nada de colocar medo nos outros, fazendo algo leve e que prenda a atenção, proporcionando ao público liberar o detetive que existe dentro dele. A fórmula deu certo, e Entre Facas e Segredos rendeu ao seu diretor uma indicação ao Oscar 2020 de Melhor Roteiro. 

Curiosamente, a cenografia do filme nos remete ao suspense, engrandecida pela variedade de personagens e suas personalidades, que, de cara, se mostram como pistas para o desvendar do crime. Nada na obra é meloso, muito menos a família, que se despe de todo o tradicionalismo e exibe uma faceta de mais desconfiança e menos amor, que, querendo ou não, está se tornando mais comum do que se possa imaginar na vida real. Assim, a película transparece a instabilidade imperativa que a não obrigatória coesão de ideologias concebe em uma sociedade qualquer; e nesse ponto, até a política partidária e os conceitos de capitalismo e comunismo vêm a tona, agravados com as revelações dos piores segredos, onde a divulgação de um testamento de reação impopular é a cereja do mais indigesto bolo comido pela família Thrombey.

Inevitáveis, o clímax e a dúvida animam o espectador, não transparecendo ser uma obra arrastada, mesmo com mais de 2 horas de duração. De maneira proposital, o primeiro grande choque de Entre Facas e Segredos é conceder ao espectador a sensação de uma conclusão antes mesmo da metade do filme. Será que isso dá certo? A princípio sim, pois é fácil a adaptação à trama, e com isso, aqueles que em outrora estavam animados em desvendar mistérios, passam a se divertir com a perspicácia e a ingenuidade dos personagens em querer desvendar a situação, em meio a um show de ganância, onde nem se imagina a que ponto se pode chegar.

Elevando tons dramáticos, Entre Facas e Segredos segue para o seu epílogo, mirando em sequências orquestradas por desespero e a dúvida sobre se vale a pena confiar no próximo. Com novos mistérios, perseguições, perigos e vítimas, todos se deparam com a dúvida sobre quem investigar e quem proteger. Assim, numa genial cartada, Rian Johnson mostra que, na verdade, os enganados não são os personagens e sim o público, que se deixou levar pela conclusão precipitada e foi tomado por uma surpresa chocante, mas que fazia todo o sentido, conforme as características de cada personagem. Logo, Entre Facas e Segredos, mesmo que tradicionalmente não tivesse condições de ser um longa plano, abusa de um efeito montanha russa, usufruindo do melhor sentido e dos mais eficientes atrativos que o mesmo pode conceder a um filme.

Com um dos melhores elencos de 2019, com destaque aos excelentes Daniel Craig, Chris Evans e Ana de Armas, Entre Facas e Segredos obtém êxito principalmente com a perspicácia de seu diretor Rian Johnson, que também assina o roteiro e a produção da obra. Ele mostra engrandecimento de sua já conhecida ousadia, capaz de abusar da periodicidade, brincando com suas crias e seus espectadores, resultando em algo louvável, que dá autenticidade ao desejo de que o cinema valorize ainda mais as figuras que compuseram essa obra.