Mesmo dividindo opiniões, onde os detratores persistem em
afirmar que não tem lógica uma pessoa simplesmente acordar e sair cantarolando
pelas ruas, é inegável que o gênero musical possui uma magia e um encantamento
especial para os amantes do cinema, que tanto o veneram. Se formos lembrar dos
grandes clássicos da sétima arte, há lugar para Cantando na Chuva, A
Noviça Rebelde, O Mágico de Óz, dentre outros. Infelizmente, o século XXI não é
possuidor de muitos exemplos de longas de extrema qualidade para o segmento. Moulin
Rouge - Amor em Vermelho, Chicago e La La Land - Cantando Estações talvez
sejam os únicos exemplos, por isso ver uma nova obra-prima como Em um
Bairro de Nova York, é de nos fazer agradecer a Deus que existem os musicais.
Toda criança adora uma história bem contada e nada melhor do
que os seres que estão na introdução de suas vidas, sentarem para ouvirem como
se tem início um pequeno sonho, com total capacidade de ser engrandecido.
Dirigido por Jon M. Chu, responsável pelo excelente Podres de Ricos (melhor
romance de 2018), Em um Bairro de Nova York é uma ode à latinidade,
que explora o obamista "sonho americano" do ponto de vista de quem
nasceu longe do muros anglo-saxões da América, intercalando sua defesa suprema
com outros ramos minoritários da sociedade, que não estão imunes a segregação
em lugar algum, tampouco nos Estados Unidos.
Escrito por Quiara Alegria Hudes, o musical, que segue a
estrutura dos premiados Evita e Os Miseráveis, até possui mais
diálogos que estes, mas exala bem mais ideias do que a própria
fonografia em si. De certa forma, é complicado para os personagens, diante das
circunstâncias e da desigualdade de condições que nos deixam arrasados, se
perguntarem: Estou disposto a realizar meus sonhos? Apesar da premissa, Em
um Bairro de Nova York consegue driblar todos os caminhos que o levaria
para um dramalhão clichê, e consegue se manter seguro em meio a atos que
esbanjavam alegria e otimismo, onde mesmo nos chatos momentos em que devemos
deixar a vida continuar, espalha-se um sentimento de que o melhor estímulo
sempre será a vitória de quem está ao nosso lado e não o fracasso de nosso
companheiro, por isso a cabeça erguida e o sorriso no rosto é um mandamento que
todos seguem rigorosamente.
Eficazmente montado por Myron Kerstein, o longa perpassa a
história contada e a história vivida, em meio a ambições pessoais e
profissionais, sem perder nenhuma conexão entre seus atos e subtramas. Logo,
para um filme com mais de 2 horas e meia de duração, Em um Bairro de Nova York não
é cansativo e não faz com que algo caia no esquecimento em seu passar de cenas.
Na salada de sonhos, dores e cores, há espaço para uma inserção na
contemporaneidade da defesa de direitos, como pôde ser conferido numa clara
alusão à atual Vice-Presidente dos Estados Unidos Kamala Harris, que mesmo não
sendo possuidora de ascendência latina, tornou-se uma referência por ser filha
de imigrantes. Mas se falta latinidade na figura política, sobra no elenco do
filme, onde o destaque maior vai para a emocionante cubana Olga Merediz e para
a cativante panamenha Daphne Rubin-Vega, que mostraram nunca ser tarde demais
para encantarem Hollywood. Enquanto isso, no quesito futuro, que todos tenham
olhos para Anthony Ramos, que após Nasce um Estrela e Hamilton,
mostra neste filme que ainda vamos falar bastante dele e no melhor dos casos.
Mas é óbvio que não se deve falar de Em um Bairro de Nova York e não citar o espetacular Lin-Manuel Miranda, que enquanto produtor, ator, roteirista e compositor da trilha sonora, estabelece seu nome como um dos mais fortes no cinema da atualidade, capaz de nos brindar com novidades e resgatar com louvor o que nos traz nostalgia, resumindo sua carreira como algo em que tudo que ele toca vira ouro. Envolvendo-nos com a coreografia sem gravidade e animando-nos a levantar nossas bandeiras e dançar ao som de "Carnaval del Barrio", ele, com todo respeito ao diretor Jon M. Chu e aos demais profissionais, é a transmissão do que há de mais primoroso nas raízes latinas, enfatizando que problemas existem, mas alegria também não falta para enfrentá-los. E alegria é o sentimento perfeito para quem se deixa envolver com este que é o primeiro grande filme de 2021.
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