ESTRELAS ALÉM DO TEMPO
DIREÇÃO: Theodore Melfi
ELENCO: Taraji P. Henson, Octavia Spencer, Janelle Monae, Kevin Costner, Kristen Dunst e Jim Parson
3 INDICAÇÕES AO OSCAR
Katherine Johnson (Taraji P. Henson), Dorothy Vaughn
(Octavia Spencer) e Mary Jackson (Janelle Monae) são pioneiras cientistas
negras, diretamente envolvidas com o envio do astronauta John Gleen ao espaço –
fato histórico na NASA e que aumentou o incentivo à corrida espacial nos
Estados Unidos. O trio, além de ter feito a diferença, ainda teve que driblar o
racismo e o menosprezo, para se consagrarem na função.
Curiosamente, enquanto eu assistia ao filme, me veio em
mente uma sábia declaração de Dom Helder Câmara sobre o carnaval, que neste mês
de fevereiro parece ser bastante oportuna. Ele disse o seguinte: “Carnaval é a
alegria popular. Direi mesmo, uma das raras alegrias que ainda sobram para a
minha gente querida. Peca-se muito no carnaval? Não sei o que pesa mais diante
de Deus: se excessos, aqui e ali, cometidos por foliões, ou farisaísmo e falta
de caridade por parte de quem se julga melhor e mais santo por não brincar o
carnaval. Brinque, meu Povo Querido! É Verdade que quarta-feira a luta recomeça.
Mas, ao menos, se pôs um pouco de sonho na realidade dura da vida!" Neste
momento, vou me abster de dizer o porquê dessa frase ter vindo a minha mente.
É necessário elucidar que todas essas louvações à Estrelas
além do Tempo têm suas pitadas de exagero. A premissa foi importante, pois
possui claramente uma mensagem de otimismo, aliada a uma história real pouco
conhecida, e que enaltece o nome de três verdadeiras heroínas, para um país que
exala patriotismo em quase todos segmentos. Tinha tudo para se tornar uma trama
marcante, mas a mesma não conseguiu escapar dos vacilos do diretor Theodores
Melfi (ou Ted Melfi), que também foi responsável pela deliciosa comédia Um Santo
Vizinho.
Numa atualidade em que muito se critica o aproveitar de
minorias somente em suas facetas estereotipadas no cinema, Estrelas além do
Tempo, com roteiro escrito pelo diretor e por Allison Schroeder, assume uma
mesma essência e um mesmo tom, e parece não se preocupar em observar que o que
estava sendo entregue era uma obra que nada se difere de outras parecidas, que
por sinal não são poucas. Tudo isso em volta de um amontoado de clichês, no que
se refere a discriminação, que transparece que é algo padronizado na sétima
arte. Neste tocante, muitos atos acontecem em meio a excessos, que numa virtual
mensagem de combate ao racismo, acaba tendo efeito contrário, pois o propagar
de situações humilhantes para os afrodescendentes não teve a força de uma
denúncia e acabou por ser um de ponto diversão para brancos. Imaginem um ultradireitista
vendo essa trama?!
É fato que se um filme é inspirado em fatos reais ou em uma
obra literária, ele não pode ser censurado a buscar a ousadia e/ou modificar
aquilo que achar ser necessário para o melhor trabalhar o audiovisual, mas Ted
e Allison parecem se autocensurar, e para piorar, ainda dão força ao trunfo dos
brancos no espaço, e o reconhecimento ao trabalho daquelas três cientistas são
puramente burocráticos, como se fossem para um ser qualquer, e isso parecia em
nada abalar os instintos racistas que rodeavam as mesmas, que por sinal não
tiveram um freio; além da artificial defesa daqueles se ensaiavam uma tolerância
a chegada de negras na NASA. Assim, o antagonismo ofuscou a benevolência em uma
história de superação.
Outro fator questionavelmente celebrado é o seu elenco, que
foi eleito o melhor de 2016 pelo Sindicato dos Atores de Hollywood, sem a
concordância da Associação dos Críticos. Há um verdadeiro show de corretismo em
Taraji P. Henson, Kevin Costner, Jim Parson e Kristen Dunst, apesar da boa pose
da primeira e do stress da última. Se há um verdadeiro destaque, ele vai para a
revelação Janelle Monae - a famosa cantora faz um debut incrível na sétima
arte, em um carisma e uma desenvoltura que fizeram o personagem crescer e
tornar-se um espetáculo à parte, bem maior que a sua concepção. Ela poderia fácil
e merecidamente ser indicada ao Oscar 2017 de Melhor Atriz Coadjuvante, mas
infeliz e inacreditavelmente, tal indicação foi para a fraca Octavia Spencer,
que fora ter criado um papel sem graça alguma, não transparece nada mágico, em
uma performance claramente construída na falta de interesse.
Diante disso, creio que já está na hora de explicar o motivo
da citação à Dom Helder Câmara no início desta crítica. O religioso disse que “se
pôs um pouco de sonho na realidade dura da vida”, e é aí que vale uma defesa à
Estrelas além do Tempo. Mesmo que a execução do objetivo tenha as suas falhas,
pelo menos ele faz o favor de nos apresentar Katherine, Dorothy e Mary. Sim,
essas mulheres existiram e poucos sabiam disso. O heroísmo foi pouco trabalhado
pelo filme, mas quem vê a obra sabe que elas chegaram em um ponto onde poucos
negros chegariam, ainda mais do gênero feminino e tratando-se daquela época. E
num atual período em que os Estados Unidos vive sob o regime opressor de Donald
Trump, que muito tem desagradado aos americanos, estar minimamente munido da
informação do fundamental papel dessas três cidadãs na história espacial da
Terra de Tio Sam, servem de alento para quem hoje vive a desesperança.
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