A FORMA DA ÁGUA
DIREÇÃO: Guillermo Del Toro
ELENCO: Sally Hawkins, Octavia Spencer, Richard Jenkins e Michael Shannon
13 INDICAÇÕES AO OSCAR
Os Estados Unidos da década de
1960 é uma nação que vive transformações, se envolve em conflitos e passa a ter uma
sociedade diferente. No laboratório secreto do governo, Elisa é uma zeladora
que se depara com uma figura monstruosa e agressiva, escondida a sete chaves pelas autoridades, mas acaba tendo uma afeição por
ela. Assim, a mulher monta um plano arriscado de fuga e que contará com a ajuda
de pessoas de sua inteira confiança, mas pode esbarrar em sujeitos perigosos.
A sétima arte se rende cada
vez mais às obras hollywoodianas de cineastas mexicanos – os últimos cinco anos
estão aí para comprovar. Após louvações a nomes como o de Alfonso Cuaron e
principalmente Alejandro Gonzalez Iñarritu, chegou a hora de Guillermo Del Toro
estar no centro das atenções, o que é uma grande justiça, visto que, em minha
modesta opinião, é dele o melhor filme mexicano da história: O Labirinto do Fauno.
Hoje, ele vê o mundo aclamar o seu A Forma da Água, que ontem (23 de janeiro) recebeu
13 indicações ao Oscar e é sim a obra a ser batida na premiação.
Roteirizando a película ao
lado de Vanessa Taylor (uma das responsáveis por escrever os episódios de Game
of Thrones), Del Toro investe na concepção de uma protagonista deficiente (muda,
no caso), mas que foge de certos parâmetros que a indústria já proporcionou.
Neste ponto, podem ser citadas Holly Hunter, em O Piano, e Rinko Kikuchi, em
Babel, que mesmo com personagens interessantes, brotavam um ar de sofrimento,
mais inerente ao que a sociedade fazia questão de assemelha-las. Já a Elisa, de
A Forma da Água, é uma mulher que desde sempre esbanja otimismo, lealdade e
felicidade, que transbordam da telona e atingem o espectador, que desde já
mantém uma boa conexão com a personagem, se agradando inclusive com o simples fato dela
adorar merengue de limão, o que prova que nenhuma decisão de um diretor para um
filme é por acaso. Tudo é minuciosamente pensado, e aqui Del Toro acertou em cheio.
Escalada como protagonista e
não deixando a peteca cair com uma forte presença, Sally Hawkins vê sua personagem,
em seu lar, rodeada pelo vizinho companheiro Giles (interpretado por Richard
Jenkins), que a trata com confiança e credibilidade na mulher que ela pode sim
lutar em ser, a ponto de sem nenhum pudor, recomendar que ela faça muito sexo.
Mas como a trama é centralizada no local de trabalho da personagem principal,
logo se nota ali uma outra amiga, Zelda (interpretada por Octavia Spencer), que
tem pose de liderança, mas que junto a Elisa forma uma união nada bem vista pelos colegas, já que uma é deficiente e a outra é negra – fazendo assim com que o filme explore,
mesmo que minimamente, o forte preconceito do período contra as minorias (o que
não se difere tanto da atualidade).
Passando a explorar seu tipo
de personagem preferido (monstro, no caso), Del Toro o introduz como uma figura
enigmática, mas propícia a ser desbravada se os demais possuíssem certo tipo de
personalidade. Não à toa, A Forma da Água investe numa Elisa mais observadora e
surpreende com uma Zelda ingênua, que tem tal defeito aproveitado pela amiga, para conseguir se aproximar da criatura e saber o porquê dela ser um grande segredo de
estado americano. Assim, a obra mescla tons divertidos e de apreensão, pois não
é tão simples considerar que pode haver uma relação saudável entre uma humana e
um monstro aquático provido da Amazônia, e que vivia acorrentado. Neste tocante,
vale lembrar de As Aventuras de Pi, onde, se era para o jovem indiano conviver
com um tigre, pois o ideal era que o animal viesse a ser domesticado. E se,
voltando para o filme aqui avaliado, o “anfíbio em forma de homem” sofria
agressões num ambiente tipicamente militar, Elisa foi corajosa o suficiente, ao
desobedecer seus superiores e se aproximar do monstro, propondo a ele um novo
comportamento, com direito a ouvir música e comer ovo cozido.
O mais interessante é a
maneira como espectador se dá conta como já está envolvido com o filme,
torcendo pela amizade entre as duas figuras centrais da obra, a ponto de não estranhar
que tal relação estava passando para algo maior, indo para o campo amoroso.
Elisa já estava tão apaixonada pela figura, quanto estava curiosa pela vida
debaixo d’água, mas como as coisas nunca são simples, eis que A Forma da Água
tem um necessário antagonismo, que se aproveita da questão de guerra que
assolava os Estados Unidos da década de 1960, e vê a criatura como uma peça de
um jogo econômico, que resultaria em muito dinheiro para a Terra do Tio Sam. E
é aí que o filme trabalha a luta por um grande amor de uma maneira ousada e que
jamais um cinéfilo esperava testemunhar, atestando a forte capacidade que
Guillermo Del Toro tem de dar uma grande maturidade às fábulas aparentemente
infantis, conforme ele já mostrou em outras obras.
Belo não somente na arte em
questão, A Forma da Água é um filme que emociona com lindas cenas debaixo d’água
e ainda propõe a quem o assiste, se deliciar com passagens com figuras
artísticas do período clássico do cinema, detentoras do fanatismo de Elisa, e capazes de fazer qualquer um
dançar ao som de um baita Chica Chica Boom Chic, de Carmem Miranda. Seu desfecho, expõe
um Del Toro seguro na adrenalina que as cenas exigiam, mas sem se desvincular
da doçura do casal principal, que é amado do jeito que é, fazendo com ninguém
torça para que aquele “sapo” vire um príncipe, já que assim é que ele é o ser
ideal, e ainda por cima, ninguém está se importando se tal romance pode vir a
ser associado a zoofilia.
Com performances espetaculares
de Sally Hawkins, Octavia Spencer e Richard Jenkins (todos indicados ao Oscar
2018), A Forma da Água é uma produção memorável, com um final icônico, capaz de
enaltecer a poesia que foi aquela relação e o deslumbre que foi o filme.
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