VICE
DIREÇÃO:
Adam McKay
ELENCO:
Christian Bale, Amy Adams, Sam Rockwell, Steve Carrell e Tyler Perry
Eis a jornada de Dick Cheney –
um simples e comum cidadão americano, que chegou a Vice-Presidência do país,
tornando-se tão poderoso quanto o titular, que era ninguém menos que George W.
Bush. Para muitos, os avanços decorrentes desse governo que, por sinal, foi
impopular, é graças a Cheney, que foi responsável por mudanças visíveis até
hoje, mesmo que muitos preguem que há controvérsias.
Chamou muito a atenção de
todos na festa do Globo de Ouro 2019, Christian Bale, vencedor do prêmio de
Melhor Ator por este filme, dedicar a vitória à Satanás, que, segundo ele, foi
a sua inspiração para interpretar o personagem. Proposital ou não, tal fato foi
um gigantesco marketing para Vice, que só engrandeceu seu nome nas bilheterias
e na temporada de premiações, aumentando a curiosidade de muitos em querer
saber a fundo quem de fato é esse Dick Cheney. Não é fácil trabalhar uma
história real, e o próprio filme, antes de qualquer coisa, garante que tentou
fazer o melhor, pois sabia que estava lidando com o inimigo.
A verdade é que a obra, dirigida e roteirizada por Adam McKay (de A Grande Aposta), prova que ele de fato não tem
escrúpulos em seus longas, não poupando ninguém de seu humor venenoso, que em
outrora o fazia ser vítima de inúmeras críticas, mas hoje garante infinitos
aplausos a ele. Mas só que, curiosamente, não é a comicidade que dá o tom ao prólogo
da obra, pois as imagens dos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 e a
ordem de pulso firme do Vice-Presidente para que seja abatido tudo o que for
uma ameaça, mostram que o filme também quer fazer valer doses de drama e
suspense.
Se é para as coisas
acontecerem por partes, McKay elabora um contexto com uma narrativa impactante, que exibe como um homem se torna quem realmente ele é, e desperta em muitos a
sensação do “quem diria que ele chegou lá” com os acontecimentos futuros. Mas só que tudo é o resultado do que o roteiro de Vice prega: “Cuidado com um homem
calado. Enquanto outros falam, ele age. Enquanto outros descansam, ele ataca”.
Eis a principal concepção de um Cheney observador, que viu na política um modo,
a princípio, de conversão, pois sua vida até então, foi digna de episódio
indesejáveis para qualquer cidadão.
Recheado de, até certo ponto,
desnecessários momentos em seio familiar, não executados com a investigação que
mereciam, Vice passa a ganhar o caráter debochado de denúncia que o diretor
tanto ama, e joga na cara tudo o que ele defende, visto como retrógrado por
muitos. Ressalta-se que é tido como o mentor da Guerra do Iraque. Bem estabilizado na conturbada política americana, admira-se, mesmo com
discordâncias, sua inteligência de saber montar um plano de poder a longo
prazo, iniciado com o respeitável cargo de Chefe de Gabinete da Casa Branca,
até o destaque na Câmara dos representantes.
Sendo assim, seria Dick Cheney
um Presidente futuro? Lógico que sim. Parafraseando o filme, metade dos Estados
Unidos quer sê-lo, enquanto a outra metade o teme. E é no momento em que ele, na
década de 1990, declina de comandar o executivo americano, que Vice passa a
acertar em cheio no lado família do político, que, numa cena fantástica, o
espectador testemunha um grandioso lado humano dele, ao se deparar com a sua
filha caçula assumindo a homossexualidade. Mas como Adam McKay não perde a
oportunidade de arrancar gargalhadas, ele, bizarramente, encerra o filme em sua
metade, com direito a créditos finais e tudo, para daí termos uma volta atrás,
típica da política, para transpor Cheney no principal cargo de sua carreira: a
Vice-Presidência dos Estados Unidos, que é iniciada às escuras pelo longa, para que a claridade chegando ao seu gabinete denote o início de um novo tempo, tão pessoal, quanto nacional.
Para o cinebiografado, vice é
aquele que só fica sentado, esperando o titular morrer. Convenhamos que muita
gente tem que aprender isso! Inexplicavelmente, sua inclusão numa corrida
presidencial veio após um gigantesco hiato em sua vida no segmento, e o filme,
endossa certas esquisitices, ao expor um George W. Bush que achava tudo aquilo
uma diversão, em meio a um Cheney contido diante dos impulsos de seu futuro
chefe, que, por sinal, talvez não havia necessidade de ter sido retratado na
obra. Não vejo uma suposta exclusão interferindo negativamente no roteiro, e
ironicamente Sam Rockwell (intérprete do ser controverso) vai disputar o Oscar
2019.
Investindo na sensatez do
protagonista, brilhantemente vivido por Christian Bale (indicado ao Oscar 2019
de Melhor Ator), embora tenham me desagradado certos trejeitos e “caras e bocas”,
Vice escancara um diferente senso de liderança, que foi abraçado, diante de uma
polêmica eleição que levou um Bush de volta à Casa Branca, porque sabiam que ali
havia a voz da experiência que os republicanos almejavam. Cheney, claramente
com um pé atrás com o futuro comandante dos Estados Unidos, chega ao ápice de
seu lado estrategista e centralizador, seja com a Câmara, o Senado, o Pentágono ou a CIA, e focalizado por Vice, com um áudio surpreendentemente cortado nas
supostas ilicitudes, torna-se um grandioso centro das atenções, diante de fatos
e questionamentos exposto num clímax excelente, que enaltece a direção e o
roteiro de McKay, e a perfeita edição de Hank Corwin.
Findados os 8 anos de mandato,
na vida pós-poder que desperta a curiosidade de muitos, um problema cardíaco num Dick Cheney idoso traz preocupação, e diante de uma delicada cirurgia, McKay
incute imagens de outros problemas vividos por americanos, lembrando que, por
mais admirável que sejam muitos pontos da vida do ex-Vice-Presidente, talvez
muitos tenham que medir bem o grau de piedade que tem do próximo, porque
convenhamos que o republicanos são historicamente mais passíveis de julgamentos
negativos do que os democratas. Mas Vice acaba dando as mãos ao político,
quando, no desfecho, dá direito para que o mesmo ressalte o que há de mais
racional nesse segmento que é a política: "Quem quer ser amado, que vire estrela
de cinema". Sendo assim, God Bless America!
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