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terça-feira, 17 de setembro de 2019

YESTERDAY


YESTERDAY
DIREÇÃO: Danny Boyle
ELENCO: Himesh Patel, Lily James, Ed Sheeran, Ana de Armas e Kate McKinnon


Jack é um músico sem sucesso, que em meio a um apagão mundial, sofre um acidente e eis que ele se torna a única pessoa no mundo que conhece os Beatles. Ao interpretar músicas da lendária banda, ele surpreende a todos, que se encantam com as canções e dizem desconhecer John Lennon e Paul McCartney. Assim, ele se torna um astro no planeta inteiro, ao mesmo tempo em que para mil e uma coisas, sua consciência tende a ficar cada vez mais pesada.


Vencedor do Oscar de Melhor Diretor por Quem quer ser um Milionário?, em 2009, Danny Boyle embarca num projeto longe de sua tipicidade e exibe uma proposta que sempre chamou a atenção de todos. Para Yesterday, é no mínimo injusto conceder-lhe todos os créditos daquilo que há de melhor no filme, visto que a até certo ponto acertada escalação de Richard Curtis (de Um Lugar Chamado Nothing Hill, Quatro Casamentos e um Funeral e Simplesmente Amor) para roteirizá-lo foi a cartada decisiva que a trama precisava para executar limitadas doses de leveza e encantamento, mas engana-se quem acha que tudo são flores nessa obra, apesar que há de admitir que a conclusão foi sim positiva.

Mesmo sem a capacidade de passarem incólumes, clichês podem ser bem ou mal usados no cinema (James Cameron com Titanic e Avatar dá show nesse quesito), e é notável que este filme não se desprende deles na construção de uma introdução que já estava mais que propagada desde a liberação da sinopse do longa. Cantar na rua ou em um barzinho em busca de uns trocados e para uma plateia quase nula é praticamente uma regra na vida de qualquer músico, e a oportunidade, mal testemunhada por sinal, de tocar em um festival é praticamente uma oportunidade em que acrescentar um tópico forte ao seu currículo é mais importante que um lucro em início de carreira. Mas como o mundo é cheio de milagres, ao ponto de fazer Benedict Cumberbatch virar símbolo sexual (como ironiza Yesterday), fica interessante o ponto central do filme, que é forte o bastante para arrancar risos regozijantes da plateia. Mas nenhum cineasta deve se esquecer que tem muito cinéfilo com conhecimento de causa e que pode ter claramente se lembrado de Como se Fosse a Primeira Vez em algumas cenas. Sendo assim, há como ter algo de positivo quando existe uma alusão indireta a Adam Sandler?

O ecoar do agora desconhecido som e o choque da sociedade britânica eclodem uma miscelânea de sentimentos. De fato, a obra é justa, pois as principais músicas dos Beatles recebem o seu devido reconhecimento e valor, e talvez a justificativa para o título seja porque "Yesterday" é mais popular música do grupo em todo o mundo. Mas como ode não é o afã principal, eis que a arrogância anda junto com aqueles se iludem com o sucesso, mas na verdade é fato que há espaço também para tornar aquela esquisitice trash em algo muito assustador: no google, os Rolling Stones se salvam, Beatles são besouros, e pesquisar John e Paul resulta hilariamente no saudoso Papa João Paulo II. A farsa unilateral está montada, e ninguém pode condenar Jack, pois qualquer um embarcaria nessa.

Se o executar da trajetória de uma nova estrela da música mundial na atualidade é um anseio de Yesterday, é compreensível o ato de intercalá-la em meio a outros nomes jovens e consagrados da indústria fonográfica, mas apesar do carisma e do talento de Ed Sheeran, não custa lembrar que, como muitos críticos já apontaram (incluindo meu amigo Marcio Sallem), sem Beatles, Ed Sheran não existiria, ou seja, isso só mostra uma inclusão gratuita no longa, sem que fossem avaliados diversos aspectos. Mas ao mesmo tempo, Boyle e Curtis conhecem muito bem o showbusiness e sabem que é o local perfeito e ideal para se viver uma mentira, e com certa categoria, são criados antagonistas fisicamente desprovidos, mas com um olhar de repulsa, onde claramente sabemos do que eles são capazes e as consequências de seus atos, mesmo que suas posturas sejam puramente silenciosas. Pé atrás jamais deixará de ser regra numa falta de veracidade.

No tocante em que não se deve desvalorizar os fãs dos Beatles, Yesterday não perde a oportunidade de enfatizar alusões diretas e indiretas, como uma viagem para Hamburgo, o Strawberry Fields, a Penny Lane, a Igreja St. Peter - o que não deixa de ser uma boa sacada, mas isso não quer dizer que o roteiro da obra seja uma maravilha, pois no geral temos um filme altamente previsível, que aos poucos vai perdendo a sua identidade, em meio a um trabalho exagerado de montagem do outrora competente Jon Harris, que fez 127 Horas com Danny Boyle. E como se não fosse o bastante, numa clara tentativa de impor uma nova característica, como montar um elenco quase totalmente desconhecido, o diretor entrega um casal principal estupidamente sem química, onde estarem ou não juntos não faz a mínima diferença e torcida por eles é praticamente algo sem a mínima chance. 11 anos depois, um Patel não funcionou com o cineasta.

Debochado e com dramas exagerados, apesar de (juro!) não ser um filme ruim, Yesterday é um entretenimento momentâneo, onde talvez não seja pertinente se questionar de vale ou não pena revê-lo, pois a desnecessariedade é fato; mas admite-se que pode haver a dúvida de como seria a recepção aos Beatles, caso eles surgissem neste ano. É bastante precipitado elaborarmos qualquer teoria, mas os garotos de Liverpool no mínimo merecem um filme de alta qualidade, que nos faria ter certeza de que eles seriam louvados em qualquer era em que iniciassem a ecoar suas canções. Enfim, deixem estar ou let it be!


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