JUDY - MUITO ALÉM DO ARCO-ÍRIS
DIREÇÃO: Rupert Goold
ELENCO: Renné Zellweger, Jessie Buckley e Finn Wittrock
Com uma carreira passando por uma séria crise, a atriz e cantora Judy Garland, mesmo com receios, acaba aceitando o convite para fazer uma turnê em Londres - cidade que a venera. Tendo que se afastar de seus filhos pequenos, ela enfrenta um princípio de depressão, que faz com que ela se vicie em álcool e remédios, mas, ao mesmo tempo, tentando compensar tudo isso com brilhantismo nos palcos.
Já é de praxe o ato da avaliação de estrelas do showbusiness que começaram bem cedo na carreira, e por mais que tenham chegado a fase adulta de uma maneira bem sucedida, tiveram sim seus dramas no meio desses caminhos. Para citar nomes, podemos ter Michael Jackson, Drew Barrymore, Jodie Foster, Macaulay Culkin, dentre outros. Infelizmente, Judy Garland, umas das maiores estrelas da história do cinema, não foi uma exceção a essa regra. Como este próprio filme, dirigido pelo um tanto quanto desconhecido Rupert Goold, faz questão de enfatizar: sua estreia nos palcos foi logo aos 2 anos. O prólogo de Judy - Muito Além do Arco-íris, ao mesmo tempo que encanta com a cenografia de O Mágico de Óz, assusta com uma garota, que ainda não tinha nem 18 anos, prestes a protagonizar um filme histórico (o melhor longa infantil de todos os tempos), mas que tinha o semblante do desespero, de querer estar com as suas amigas, viver sua juventude, só que atormentada com os sussurros de que poderia virar milionária com menos de 20 anos. Tudo bem, a cada escolha, há uma renúncia, mas psicológico e maturidade, nem todos têm para isso.
O que se vê além do apaixonante arco-íris de Dorothy ou das singelas paredes de um estúdio de cinema da década de 1930? Segundo pregou corretamente o roteirista Tom Edge, que já assinou textos da série The Crown, o que se vê é a obrigação de dar sonhos às pessoas, pouco importando como está sendo a sua vida. No caso de Judy, estava sendo a mais difícil possível. Chegar aos 40 anos, com a carreira em baixa, com dois dos seus três filhos ainda pequenos, sem uma casa para morar, e ainda enfrentar um processo judicial pela guarda das crianças, tornam-se as mais temidas provas de vida, em que todos buscam forças até onde não existem para driblar o percalço. Mas o filme traz um alerta: Judy Garland, apesar de estar em baixa, não era uma pessoa qualquer, e mesmo que Hollywood estivesse se reinventando, dando valor a outros nomes, em algum lugar a chama da estrela de outrora ainda estava acesa, e novamente tendo que renunciar para escolher, a lenda acreditou em seu ressurgimento, mesmo com pontos pesando contra.
Uma casa de shows londrina lotada, e os vícios só se multiplicando. É doído perceber que essa é uma realidade em boa parte das estrelas de cinemas, independente de geração. Quase 30 anos após a morte de Judy, Heath Ledger nos deixou da mesma forma. Entre aplausos e venerações, Garland, em solo britânico, ainda convivia com a pertubação e a insegurança. Curiosamente, como muitos críticos apontaram, essa história de vida se assemelha com a de sua intérprete Renné Zellweger, que foi praticamente a rainha do cinema no início dos anos 2000, tornando-se a única atriz (até hoje) a disputar o Oscar por três anos seguidos no século XXI (2002, 2003 e 2004, mais precisamente), tendo vencido no último, como Melhor Atriz Coadjuvante por Cold Mountain; e posterior a isso, viu a carreira declinar, tendo feito talvez apenas um filme de relevância, que foi A Luta pela Esperança, do Ron Howard, só que curiosamente os méritos da obra foram dados para Russell Crowe e para Paul Giamatti. Dezesseis anos depois, Renné volta para o maior prêmio do cinema mundial, com uma performance arrebatadora, provando que ela e a personagem real têm o poder da reinvenção, que não perde a sua majestade e se torna um prato cheio para quem venera a arte.
De fato, não pode ser dito que Judy - Muito Além do Arco-íris é um grande filme. Os flashbacks foram desnecessários, sendo que só aquele primeiro ato já explicava muita coisa. Ao mesmo tempo, é de entender que muitos fãs devem ter se decepcionado pelo grande foco à sua carreira como cantora nos palcos de Londres, ocultando a atriz Judy Garland, seu período de gravações de O Mágico de Óz e os louros colhidos por esse filme e outras obras de sucesso, como uma das versões de Nasce uma Estrela e o aclamado Julgamento em Nuremberg; além de, claro, seu casamento com o grande Vincente Minnelli, do qual nasceu a mais famosa de suas crias: a vencedora do Oscar Lisa Minnelli. Talvez essa esperada cinebiografia, que não atingiu a popularidade almejada enquanto trama, pode servir de exemplo para uma nova e futura homenagem cinematográfica.
É fato que Judy Garland gostava do showbusiness, da badalação, da fama, mas não se deslumbrava com aquilo, tamanha mulher acessível que era, e Judy - Muito Além do Arco-íris, escancara que entre alegrias e chateações, ela chegava a ser capaz de buscar em fãs desconhecidos o acalanto para os momentos de tormento, tratando-os como confidentes e vice-versa, buscando neles a ajuda necessária para renascer, abdicando de estar sempre em volta das grandes estrelas para se sentir no auge. Era uma mulher simples, que dava dignidade à sua profissão, sem superestimar os bônus que ela dá. Dessa forma, a atriz e cantora, mesmo até quando seu lado mãe é questionado, busca uma caminho de reencontro com a felicidade e não desiste dele em hipótese alguma.
Tendo o seu desfecho girando em torno de um momento de redenção, Judy - Muito Além do Arco-íris ecoa a lendária canção "Somewhere over the Rainbow", intepretada por ela e tida como a melhor da história do cinema, como uma metáfora pela busca do que há de positivo na vida. Ciente que O Mágico de Óz emociona em qualquer circunstância, a música é interrompida tal qual a carreira de Judy, e a cantoria é retomada justamente por aqueles que jamais perderam a fé na artista. Logo, foi um retratar perfeito de como Garland teve uma vida efêmera, findada em 1969, aos 47 anos; mas ela sempre se manteve viva, não só pela força de sua marca e seu talento, mas também pela retribuição de todos aqueles que souberam valorizar um nome que até hoje tem o dom de encantar.
"Um coração não se julga pelo o quanto amou, mas pelo quanto se é amado pelos outros"
O Mágico de Óz




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