ILHA
DOS CACHORROS
DIREÇÃO:
Wes Anderson
ELENCO:
Bryan Cranston, Edward Norton, Greta Gerwig, Bill Murray, Jeff Goldblum,
Frances McDormand e Scarlett Johansson
Na cidade japonesa de Kobayashi,
um cruel político aprova uma lei que diz que cachorros não podem mais conviver
com humanos e devem ser enviados para uma ilha com péssimas condições de
sobrevivência. Tal fato revolta a muitos, principalmente o jovem Atari. Ele decide
recrutar amigos e inicia uma perigosa aventura, com intuito de devolver a todos, a
convivência com o melhor amigo do homem.
Estamos a um pouco mais de cinco
meses para o término de 2018, e o que prometia ser um confronto épico sobre qual
será o melhor filme de animação do ano já aconteceu, num formato em que pode
ser feito o tira-teima da melhor maneira possível, pois Os Incríveis 2 está em
cartaz ao mesmo tempo em que estreia Ilha dos Cachorros, apesar do Brasil não
ter comprado a ideia de um bom lançamento comercial deste último, que será
avaliado nesta crítica. Dirigido pelo excêntrico e criativo diretor Wes
Anderson (de O Grande Hotel Budapeste e Moonrise Kingdom), roteirizado por ele,
ao lado de Roman Coppola, Jason Schwartzman e Kunichi Nomura, e impressionando
pelo visual proposto pela técnica stop-motion, a obra marca a volta do cineasta
às animações, após o sucesso de O Fantástico Senhor Raposo, que lhe rendeu uma
de suas seis indicações ao Oscar.
É no mínimo interessante ver
uma trama centrada em cachorros ser estrategicamente ambientada no continente
asiático, que é uma região onde é típico o consumo da carne do animal. Mas como
tal fato é mais comum na China, Ilha dos Cachorros adentra ao Japão, investindo
em novos territórios, onde de acordo com a mente do autor, a vida não é fácil
para os caninos. Seu prólogo nos dá uma ideia de algo dinástico num império
onde os antepassados já tinham uma célebre relação com os cães, cabendo a cada
um avaliar se era positiva ou negativa. Até podem ser notadas certas
semelhanças do início do filme com a franquia Kung Fu Panda, mas garanto que não
é algo preocupante, pois é fato que Wes Anderson é inteligente o suficiente
para estruturar uma trama com grandiosos toques de originalidade, passando longe de cópias baratas e mal feitas.
A trilha sonora composta pelo
talentosíssimo Alexandre Desplat é recheada de um sentimento de suspense, que
enche o espectador de dúvidas sobre como será o desenrolar de Ilha dos
Cachorros. A verdade é que os animais são retratados após a fatídica situação
que os levou a segregação, como se fossem uma outra sociedade, e digo mais, bem
parecidos com os marcianos que muitos terráqueos ainda sonham verem sendo
descobertos. Numa inevitável disputa de demarcação de território, ao mesmo
tempo eles buscam saber os motivos que levaram o homem a investir nessa
exclusão, ao passo que também surgem as dúvidas sobre o que fizeram para tal.
Diante disso, mesmo se tratando de um filme infantil, Ilha dos Cachorros mostra uma nova faceta em que Wes Anderson tem o dom de transformar seus produtos em metáfora, comprando
também a briga pelas minorias, visto que a película não deixa de ser um retrato
um tanto quanto fiel da maneira como muitos segmentos da sociedade mundial têm
sido desprezados e apenas uma pequena parte luta pela reversão dessa situação.
Na eminência da perda dos dois
bens mais preciosos de um ser humano (a vida e a liberdade), métodos radicais
em prol dos mesmos, são trabalhados pela trama com uma gigantesca complexidade
no que diz respeito ao embate com as noções disciplinares impostas pelo antagonismo
de Ilha dos Cachorros. Aproveitando a contemporaneidade de uma sociedade cada
vez mais sem empatia e sem amor ao próximo, lavagens cerebrais acabam por sobressaírem,
em meio a mecanismos de tecnologia e de lutas corporais, que mais uma vez
comprovam a criatividade de Wes Anderson, que usa de diversas características
culturais do Japão para o melhor fazer valer a ideia de sua mais nova obra.
Minuciosamente, todas essas
qualidades são bem perceptíveis em Ilha dos Cachorros, o que fomenta uma
espécie de invencibilidade de seu autor em sua carreira. Agora para uma obra
que, apesar de boa, não chega perto de ser excelente, o fator “balança” pesa
(perdoem o trocadilho) em seu final, visto que no supracitado duelo, não há
dificuldades em dizer que Os Incríveis 2 é a melhor animação até o presente
momento, e ao final de 2018, dificilmente poderá ser colocado este filme aqui
avaliado como um dos melhores do ano – fato um tanto quanto inédito para Wes
Anderson, que num mandamento que diz que quem está no auge, deve buscar se
manter nesse patamar, vê alguns degraus abaixo das obras-primas do ano lhe dando
boas vindas. Pelo menos há a consciência de que no futuro, os degraus mais altos
sempre estarão de portas abertas para ele.
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